Acordando pt 2 e Valter

Brasil, 13 de Agosto de 2070.

A primeira cena que vi quando acordei eram várias pessoas, médicos, jornalistas e autoridades me observando do outro lado do vidro de uma câmara vertical, do mesmo modelo daquelas de filmes de ficção científica que assistira antes, estava frio, mas começava a esquentar lentamente. Olhavam, conversavam e riam entre si, enquanto robôs voadores munidos de câmeras filmavam os jornalistas á medida que estes falavam e gesticulavam sem, contudo, me perder do foco.

Estava apenas de cueca, alguns suportes macios me seguravam pelos ombros impedindo que eu me mexesse ou caísse, estava mais surpreso do que com medo daquelas pessoas, me mantinha imóvel, rígido, tentando imaginar o que estava acontecendo, não tive tempo porque a câmara se abriu e alguns enfermeiros apareceram para me ajudar a sair.

Caí, não conseguia me manter de pé, estava esquálido e fraco, trouxeram então uma cadeira de rodas high-tech, com um lindo design prateado e botões de contato brilhando em verde e azul, ao que ouvi um dos doutores falar “Não a ligue às suas sinapses, ele ainda não sabe controlá-la” e um dos enfermeiros apertou alguns botões da cadeira e esta desligou imediatamente, tornando-se uma cadeira de rodas “comum”.

Segui por entre aquele turbilhão de pessoas que me perguntavam coisas sem sentido, como eu me sentia, o que eu iria fazer, me sentia uma criança descobrindo o mundo pela primeira vez.

Foi quando fui guiado para dentro de uma sala por um dos doutores, o enfermeiro que empurrava a minha cadeira saiu da sala e fechou a porta, mas não sem antes dar passagem a outro médico já de idade. Estava ali com aqueles dois senhores alegres e entusiasmados, enquanto eu olhava aquilo tudo sem entender coisa alguma, um frente a mim, sentado em uma mesa de madeira, e outro ao meu lado acompanhando a conversa.

Conversamos sobre o que tinha acontecido, como eles tinham cuidado de mim, sobre o acidente, sobre a minha família, sobre o ano em que eu estava, chorei, tive vontade de gritar, mas minha voz ainda não tinha força para tanto, estava sufocado, era muito coisa para digerir, acabei desmaiando.

Recobrei minha consciência, fiquei sem falar sobre nada a ninguém durante meses, apenas olhando através da janela do hospital aquele novo mundo que eu feito Colombo descobrira, ou teria sido descoberto e contra a minha vontade melhor dizendo. Esperava que aquele mundo penetrasse por aquela janela e minha mente o absorvesse por osmose, estava triste, mas estava vivo, era isso que importava e não adiantaria ficar ali me lamentando pelo que aconteceu.

A partir de então comecei a conversar com minhas enfermeiras e consegui processar melhor as coisas, soube que poderia conseguir um emprego, uma nova vida. Comecei a frequentar as sessões com psicólogos, fisioterapeutas e médicos em geral, inclusive esta é uma parte interessante que deixarei para contar depois, e também a dar algumas entrevistas falando do meu estado de saúde, dos médicos e das coisas que ainda não sabia, entre elas: o rumo da minha vida.

Foi quando os médicos me disseram estar apto a realizar algumas visitas externas e botaram como meu guia o Valter, sujeito alegre e disposto, exímio conhecedor do tudo e especialista do nada, como ele mesmo diz!  Era mais que hora de redescobrir o meu próprio mundo novo.

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